Putin 6.02

Putin sabe muito bem com quem conversar. Biden, Kamala Harris, são detalhe. Ele negociou diretamente com o representante de setores que mandam no mundo – grandes bancos, indústria petroleira e indústria bélica dos Estados Unidos. Deu certo. Seu parceiro americano, Trump, atrasou por mais de seis meses o pacote de ajuda militar à Ucrânia, dando a Putin o tempo que precisava para ampliar o território sob sua ocupação.

Tudo fica mais fácil se você tem artilharia, mísseis de precisão, apoio aéreo e o seu inimigo não. Mesmo assim, com seus tanques trafegando impunes sem mísseis Javelin para ameaçá-los, seus helicópteros voando livremente sem mísseis Stinger para abatê-los, Putin não conseguiu avançar muito. Providências tiveram que ser tomadas. Putin demitiu alguns generais, prendeu outros e deu outros por desaparecidos. (Como “some” gente na Rússia, não?) Convocou quase 500.000 homens para servir na Ucrânia, entre presidiários e conscritos, treinados às pressas para tentar explorar a fragilidade ucraniana, antes que a ajuda americana e os F16 holandeses chegassem.

E eis a história se repetindo:  exatamente como os americanos no Vietnam, os russos se viram lidando com soldados mal treinados que desperdiçam uma quantidade enorme de munição, com pouca efetividade. A mesma solução foi aplicada: substituir o cartucho 7,62 das Kalaschnikov pelo 5,45 – a versão russa do conhecido 5,56 americano. O intento foi o mesmo, compensar a falta de pontaria dando ao soldado mais tiros por carregador, usando um cartucho de potência semelhante.

Mas a eterna luta entre o canhão e a blindagem – neste caso, o fuzil e os coletes balísticos – não acabou. O comando das forças russas descobriu que os poucos acertos dos seus soldados não representavam necessariamente ucranianos mortos. A linha de frente da infantaria ucraniana está bem equipada com coletes balísticos modernos, compostos por ligas de aço de alta resistência, Kevlar, cerâmica e tecido resistente à perfuração.

Putin não pode fazer nada – ou muito pouco – a respeito da baixa qualidade de seus novos soldados, ou a respeito dos misseis ucranianos que agora caem sobre refinarias russas, machucando o bolso dos russos. Mas, isso ele pode fazer.

Este é o novo calibre russo para fuzis, o 6,02mm. Note que a diferença de diâmetro para o 5,45mm é mínima, portanto os carregadores ainda levarão uma quantidade de projéteis significativamente maior que o tradicional 7,62. Mas o novo projétil tem mais carga de pólvora, resultando em uma trajetória muito mais reta, facilitando muito o tiro de distâncias superiores a 300 metros, com auxílio de miras ópticas. E – a cereja do bolo – o núcleo do projétil não é apenas de chumbo revestido por cobre, como quase todos os outros no mundo. Ele tem um núcleo pontiagudo de aço especial, de receita obviamente não revelada.

Quando o revestimento de cobre se choca com a placa metálica de blindagem do colete à prova de balas, ela se rompe, perde energia e pára por ali. Mas a flecha de aço continua se movendo e atravessa os coletes como se fossem papelão. As unidades que receberam esta nova munição reportaram um aumento absurdo de efetividade, especialmente acima de 300 metros de distância. Até então, o soldado russo dificilmente acertaria o tiro, mas, se acertasse, o projétil não penetraria os modernos coletes usados pelos ucranianos. Com o 6,02 , o tiro não apenas fica mais fácil, mas, certamente, retira um ucraniano do campo de batalha. (Se definitivamente ou não, depende de cada caso. Mas o estrago feito no corpo humano pelo 6,02 é bem maior que 5,45.)

E no meio de uma era tão tecnológica, com os dois lados lutando para ter o avião que não é visto pelo radar ou o míssil com a eletrônica mais complexa, para supera as defesas aéreas inimigas, estamos de volta ao básico. Quem tem mais projéteis de artilharia de 155mm põe as tropas do outro para correr. Quem tem o fuzil mais efetivo, causa mais baixas na infantaria inimiga e ocupa o terreno. O número de baixas na infantaria ucraniana deve aumentar muito nas próximas semanas.

É a vez de Zelensky de perder o sono.